Massacres Prisionais: a origem?

Era 2 de outubro de 1992. Os “caras-pintadas” comemoravam o afastamento de Fernando Collor após seu impedimento ocorrido três dias antes. O clime era de libertação na nação tupiniquim, mas nem todos compartilhavam da liberdade. Alheios (ou não) ao clima do país, detentos do pavilhão 9 do Carandiru, apelido da Casa de Detenção de São Paulo, instalavam uma rebelião e a Polícia Militar paulista viria a intervir. O resultado, de acordo com Gil Gomes, foi mais de 300 detentos mortos, apesar de Pedro Franco de Campos, então Secretário de Segurança Pública que autorizou a intervenção policial, ter minimizado esse número ao declarar à imprensa que foram “apenas” 111 presos mortos. Franco de Campos deixaria o cargo de SSP nos dias que se seguiram e, por indicação do governador Luiz Antônio Fleury Filho, assumiria a pasta o então Procurador Geral do Estado Michel Temer.

Não há qualquer registro oficial, mas há relatos de que, indignados com o massacre, os detentos sobreviventes do Carandiru teriam deliberado pela fundação da facção criminosa Primeiro Comando da Capital no ano seguinte. Citada fação, vinte e três anos depois de sua criação, tem seu nome vinculado a outro massacre prisional. Há poucos dias, quase 100 detentos (em números oficiais) foram mortos em penitenciárias de Manaus e Boa Vista, todos aparentemente membros do PCC, em decorrência de desavenças entre facções. Muitos não vêem conexão entre dois episódios. E de fato há diferenças. O palco é diferente: um no sudeste, outro no norte. No primeiro, o estado interviu com 286 policiais da Tropa de Choque comandada pelo Coronel Ubiratan Guimarães. No segundo, o estado seguiu os passos de Pôncio Pilatos e culpou as empresas do Consórcio Pamas que assumiu a gestão penitenciária no Amazonas após a privatização (apesar da responsabilidade constitucional ser dos estados). Em 1992, Temer recomendou “repouso e meditação” aos policiais envolvidos assim que tomou posso como SSP. Em 2017, o mesmo Temer não recomendaria o mesmo tratamento em um país que mata, em média, 490 policiais ao ano (de acordo com Alexandre Garcia em entrevista à Rádio Itatiaia de 11/11/14), então anunciou, ao lado de ministros, o Plano Nacional de Segurança.

Há, entretanto, algumas inquietantes coincidências e ligações entre os dois acontecimentos. Se alguns pensaram que o recente anuncio no Plano Nacional de Segurança foi oportunista, o que dirão quando recordarem que Ubiratan Guimarães se elegeu deputado estadual em 2002 com o número 14111, em referência aos 111 mortos do Carandiru? Cento e onze, aliás, também é o número de policiais tombados por disparo de arma de fogo em 2016, segundo o site de jornalismo policial “Pauta do Dia”. O PCC teria nascido do seio do Carandiru com o objetivo de “vingar a morte dos cento e onze presos”; a mesma facção assina mensagem clamando por vingança que tem circulado no WhatsApp nos últimos dias. Outra coincidência: ambos os episódios ocorreram em momentos conturbados da democracia brasileira, após impeachment. Além disso, Temer se pronunciou sobre os dois eventos quatro dias após terem acontecido; em 1992, pronunciou-se quando de sua posse como SSP e em 2017 quando de uma reunião com ministros da área de segurança pública.

Coincidências? Não. Vemos que a história é cíclica e encadeada. Talvez possamos, assim, prever o futuro. Afinal, “quando penso no futuro, não esqueço o meu passado” (Viola, 1972). Se hoje contamos 93 mortos no norte, não seria de se surpreender se alguém usasse do “acidente pavoroso” e viesse a se candidatar nas eleições vindouras usando esse número. Mas quem? Talvez o peemedebista (futuro ex) Secretário Nacional de Juventude, Bruno Júlio, seja um dos prováveis por ter ganhado atenção da mídia ao afirmar que “Tinha é que matar mais. Tinha que fazer uma chacina por semana”.

Que a força esteja com os eleitores.

 

Saiba mais:

http://sao-paulo.estadao.com.br/…/geral,pcc-ja-teria-plano-…
http://g1.globo.com/…/temer-afirma-que-chacina-no-presidio-…
https://robertatrindade.wordpress.com/estatistica-de-polic…/
https://pt.wikipedia.org/wiki/Massacre_do_Carandiru
http://blogs.oglobo.globo.com/…/sobre-chacina-secretario-de…
https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Dança_da_Solidão